Vivendo na China

14 jan 19

Os 40 anos da China da reforma e abertura

Shenzhen – 40 anos da política de reforma e abertura na China.

Em 18 de dezembro do ano passado, a China celebrou os 40 anos da política de reforma e abertura iniciada em 1978. Depois da fundação da República Popular da China, em 1949, esta política é o evento mais importante que marca uma virada histórica nos rumos do país. Naquele ano de 1978, a economia chinesa estava em colapso após a controvertida Revolução Cultural (1966-1976). A morte de Mao Zedong, dois anos antes, mergulhara o Partido Comunista da China em um período de incertezas devido às disputas internas pelo poder e pela orientação política a ser dada para o futuro. Em meio a este contexto, a figura de destaque foi Deng Xiaoping. Após assumir a liderança do Partido, Deng defendeu uma política de reforma e abertura com o objetivo de modernizar o país. O plano de modernização se baseava, principalmente, na atração de investimentos estrangeiros. No âmbito da política externa, a China buscava equilibrar-se entre as duas superpotências da época, Estados Unidos e União Soviética, sem se alinhar a qualquer uma delas. O que prevalecia era o esforço concentrado na defesa do interesse nacional identificado com o crescimento econômico.

Deng Xiaoping sofreu resistências e enfrentou críticas dentro do Partido oriundas de pessoas que viam na sua política de reforma a abertura o risco de promover uma evolução pacífica do socialismo para o capitalismo. Entretanto, o que ali nascia era um modelo de desenvolvimento econômico peculiar que passou a ser conhecido como “socialismo com características chinesas”.

13 jan 19

Vídeo: China Hoje – 40 anos da política de reforma e abertura (Parte 2)

Neste vídeo, contamos com a participação especial de três entrevistados: Embaixador Augusto Castro Neves (Presidente do Conselho Empresarial Brasil-China), Dr. Ronaldo Veirano (Sócio fundador do Veirano Advogados) e Gabriel Guarino (campeão brasileiro e sul-americano de Wushu). Todos eles compartilharam suas visões sobre a China atual. Particularmente, é sempre uma oportunidade de aprendizado. Mesmo eu já tendo morado três anos na China e ir constantemente a este país, há muitas “Chinas” conforme a experiência, o momento e o lugar visitados por outras pessoas. Vale a pena ouvir o que os entrevistados dizem. Clique aqui para conferir.

13 jan 19

Vídeo: China Hoje – 40 anos da política de reforma e abertura (Parte 1)

No dia 15 de novembro de 2018 retornei à China pela terceira vez no ano mas agora para, dentre outras atividades, participar de uma visita à província de Guangdong, no sul da China, patrocinada pela China Today. Foram convidados jornalistas da Folha de São Paulo, do Estadão, da agência de notícias da Rússia, o amigo da China Hoje, Alfredo Nastari, e um professor da UERJ de relações internacionais. Fomos à Guangzhou, Shenzhen, Zhaoqing e Zhuhai e visitamos empresas de tecnologia chinesas e algumas zonas econômicas da região do delta do rio das pérolas. Na ocasião, gravamos um vídeo no contexto das comemorações dos 40 anos da política de reforma e abertura da China. Clique aqui para assistir.

12 out 16

Os 95 anos do Partido Comunista da China

Imagem.95AnosPCCh

Em 1o de julho deste ano celebrou-se o 95o aniversário do Partido Comunista da China (PCCh). Trata-se do maior partido governante do mundo com mais de 88 milhões de membros e 4.4 milhões de organizações. É um número notável quando se sabe que o partido foi fundado por pouco mais de 50 membros em 1921. Para além destes números extraordinários, a história do PCCh e de seus líderes é também uma digna epopeia. Um dos seus momentos principais é o da fundação da República Popular da China, em 1949. Governando o país há 67 anos, o PCCh transformou a China de uma sociedade rural e economicamente atrasada para uma sociedade moderna, majoritariamente urbana, científica e tecnologicamente desenvolvida, que retirou 600 milhões de pessoas da pobreza nos últimos anos e que se transformou na segunda maior economia do mundo.

Daqui a cinco anos será celebrado o centenário do PCCh e, até lá, a meta é fazer com que a China torne-se uma sociedade moderadamente próspera. Sabemos que o gigante asiático entra numa fase de seu desenvolvimento econômico que tem sido chamado de “nova normalidade”, caracterizado por um crescimento mais lento e uma necessária restruturação de sua economia. O fato é que aquela meta depende da qualidade da governança exercida pelo PCCh. Para isto, o Partido tem tomado medidas importantes. Destaco, aqui, duas delas:

12 out 16

O Confucionismo para o Século XXI

Statue of Confucius at Confucian Temple in Shanghai, China

Reconhecido como um dos maiores pensadores chineses, Confúcio (Kǒngzǐ, 孔子 – 551 a 479 a.C) elaborou uma doutrina com lições valiosas para líderes garantirem a ordem e a prosperidade em seus reinos. Seus ensinamentos influenciaram gerações futuras tanto na China como em outros países asiáticos. Thorsten Pattberg, autor do livro The East-West Dichotomy, afirma que “Confúcio provavelmente é para a Ásia Oriental o que Jesus Cristo e Platão são para o Ocidente”.[1] Uma comparação audaciosa ao situar Confúcio como referência tanto da filosofia como da religião. A despeito disto, o confucionismo continua sendo pouco estudado e, até mesmo, ignorado fora da Ásia.

O pensamento confucionista exerceu grande influência no período dinástico. Como ideologia política, ele servia aos objetivos de manutenção da ordem por meio do respeito à hierarquia, tanto na esfera política como social, do conhecimento das lições dos clássicos como fonte confiável de saber, e do respeito aos ritos, isto é, às regras de conduta tidas como corretas para cada tipo de relação.

Mesmo após ter sofrido grande rejeição no período maoísta por ser considerada uma filosofia que perpetuava valores conservadores, a herança confucionista é ainda vertebral na cultura chinesa atual. E mais do que isto, tem se tornado um capital cultural valioso para o governo chinês.

03 out 15

Fim da política do filho único, fim de uma era

Blog.Child.PolicyRenshan renhai (人山人海) é uma expressão chinesa que poderia ser traduzida como “montanha de pessoas, mar de gente”. Transmite a ideia de multidão. Esta frase se aplica perfeitamente durante o período do feriado nacional que começou no dia 1o de outubro para celebrar a fundação da República Popular da China. Decidi aproveitar a manhã ensolarada e azul do segundo dia do feriadão para ir até o Yuyuan Garden aqui em Shanghai. Local de arquitetura tipicamente chinesa com um comércio vibrante que passei a gostar para passar meu tempo em dias de descanso. Não deu outra: uma montanha de gente, um mar de pessoas. Devido a isto, a circulação no local tinha que obedecer a direção estabelecida pelos policiais. É nestas horas que você vive a China de um jeito que também lhe faz entender muitos aspectos do cotidiano deste povo.

A China conta, atualmente, com uma população de 1.38 bilhão de habitantes distribuídos em 56 etnias. Dados oficiais dizem que pouco mais de 90% deles são da etnia Han. A China, portanto, é Han. Estima-se que em 2020 a população será de 1.43 bilhão e, em 2033 alcance o pico de 1.5 bilhão. Neste oceano de gente um núcleo bem menor ocupa um lugar central na estrutura da sociedade e na manutenção da ordem social: a família. Ela é central na cultura chinesa. Diferentemente do Ocidente onde cada novo casal inaugura um núcleo familiar quase independente de suas famílias de origem, na China, o novo casal casa com as famílias de seus respectivos cônjuges e que não se restringe aos avós, pais, filhos e netos – ela alarga-se na linha horizontal de parentesco de modo a incluir tios, tias, primos, primas de todos os graus. A família chinesa é a perfeita tradução da noção de “coletividade” no maior país dito comunista do mundo: na perspectiva do indivíduo chinês, o “coletivo” vai até aonde a vista alcança um parente. Pela família, o chinês faz o que for preciso. As exceções inserem-se dentro da rede de relações pessoais cultivadas pelos chineses – conhecida pela expressão “guanxi” (关系).

Um país com uma população majoritariamente homogênea em relação à etnia e ao modo como organiza o papel da família e seus valores tem na sua expressão numérica um fator importante. A demografia e as políticas de planejamento populacional podem explicar certos padrões comportamentais das famílias, bem como as mudanças que poderão ocorrer nos seus hábitos e, no limite, no seu próprio conceito.

01 dez 14

Beijing Blue

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Na primeira semana de novembro de 2014 conheci o outono de Beijing. Esta época do ano é tida como uma das mais agradáveis para visitar a capital da China. O inverno já preparava a sua chegada discretamente no suave frio do dia e nas folhas amareladas das árvores. Hospedei-me no Beijing International Hotel localizado em uma das vias principais da cidade: a Jianguomen dajie (建国门大街). Era minha sétima vez em Beijing desde que cheguei na China. Mas notei que havia algo diferente no ar: o céu estava maravilhosamente azul. Esta não é a regra.

A chegada do inverno, especialmente no norte da China, é acompanhada de um fato desagradável para a população: o agravamento da poluição do ar causado não só pelas fábricas próximas e pelo elevado número de carros (só em Beijing há mais de 5.44 milhões de veículos. Em 2007, havia 2.88 milhões), mas também pelo aumento do consumo de carvão em razão dos milhões de fornos que são ativados para o aquecimento das casas. Por isto, o inverno é o pior período do ano para respirar.

A poluição do ar na China chega a cobrir, por vários meses, mais de um milhão de quilômetros quadrados do seu território. Em 2013, Beijing ficou coberta pela fumaça em 60% do ano. Logo, menos da metade dos dias do ano tiveram níveis de poluição considerados “moderados” ou “bons”[1]. Xangai, por sua vez, ficou coberta entre 30% a 50% do ano. É comum encontrar pessoas usando máscaras protetoras nas ruas. Mas não se trata de um hábito levado a sério pela maioria da população. Muitos acham que estas máscaras não evitam o ar poluído. Há algumas especiais da 3M que já vi usarem. Mas é mais raro ainda encontrar quem as use. De todo modo, como bem disse o jornal China Daily, as pessoas se tornaram “aspiradores humanos em uma metrópole poluída”.[2] A causa central desta poluição é o padrão energético da China associado ao seu rápido desenvolvimento econômico. Por quê?

22 nov 14

Entrevista para a China Radio International

China-RadioNo dia 26 de outubro foi ao ar uma entrevista minha concedida à China Radio International (CRI). Dentre os temas abordados, eleições no Brasil e as pesquisas desenvolvidas no Centro de Estudos dos BRICS da Universidade Fudan, aqui em Xangai. A entrevista, aos 16 minutos da programação da rádio, está disponível no link: http://portuguese.cri.cn/741/2014/10/27/1s190998.htm

O site da China Radio International é uma excelente fonte de informação em língua portuguesa sobre temas relacionados à China e, ao mesmo tempo, uma fonte de informação essencial para os chineses que estão estudando o nosso idioma e querem saber mais sobre os países de língua portuguesa. Conheci alguns profissionais brasileiros e chineses que trabalham para a CRI. Todos muito profissionais e interessados em fazer deste site uma ponte essencial para a aproximação dos povos de língua portuguesa e os chineses.

12 ago 14

China para além dos estereótipos

Lujiazui2

Faz um ano e meio que estou na China. A minha impressão é que o tempo vivido neste país será sempre insuficiente para conhecê-lo em profundidade. Tenho encontrado muitas pessoas que se apresentam como “especialistas em China”. Surpreende-me a pretensão. Às vezes são pessoas que só vieram aqui por alguns dias ou semanas e sequer possuem um nível básico do idioma chinês. Muitos leem sobre a China em livros escritos também por pessoas que sequer passaram um ano inteiro em completa imersão cultural neste país. Além disso, há poucos livros sobre China escritos por chineses que tenham sido traduzidos para um dos idiomas ocidentais mais acessíveis para nós. As muitas obras em inglês que tratam da China foram escritas por não-chineses. E aí todo cuidado é pouco. Por quê?

Falar de um país que não o nosso nos coloca inúmeras questões. Geralmente a nossa primeira percepção sobre um país ou um povo é influenciada por estereótipos consolidados em nossa própria cultura. Por exemplo: a imagem que temos do “alemão” contrasta com a que temos do “brasileiro”. Faz pouco e vimos a Alemanha ganhar a Copa do Mundo no Brasil. Todos elogiaram o planejamento e a disciplina dos alemães como sendo o segredo do sucesso deles. Mas uma pergunta fica no ar: e se tivesse sido a Argentina a campeã? O que explicaria este eventual resultado?

Os estereótipos definem o modo como enxergamos cada um dos povos e, por contraste, a nós mesmos. Nós nos vemos ou somos visto (ou nos deixamos ser vistos) a partir de certos pontos de vista. Assim, os estrangeiros costumam “ver” o Brasil como o país do samba, do futebol e carnaval. Seríamos um povo alegre, despreocupado, quase irresponsável com seu próprio destino. Os estrangeiros desconhecem a elevada taxa de homicídio em nosso país e também o quanto somos trabalhadores. Mas ainda assim seríamos, como disse Nelson Rodrigues, uma “pátria de chuteiras”.

Quase sempre os estereótipos possuem uma forte carga de discriminação, sendo uma “ameaça” para quem dele é vítima e assim, sem querer, sabota sua própria capacidade de construir sua própria identidade. Muitas vezes, na falta de saber ver a si próprio como se é ou se quer, definimo-nos a partir do olhar (que temos) do outro. Aí é quando falar mal do outro torna-se uma estratégia para, indiretamente, dizer algo mais sobre nós mesmos. O problema está neste “algo mais”.

Qual a percepção que os brasileiros temos da China e dos chineses?

26 mar 14

A China rural já era, a nova China é urbana

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Imagine um condomínio com 28 torres, cada uma com 24 andares e 4 apartamentos de 150 metros quadrados por andar. Supondo uma média de 3 moradores por apartamento, este condomínio pode ter mais de 8.000 moradores – uma população equivalente a de muitas pequenas cidades brasileiras tais como Dores do Turvo (MG), Cocal dos Alves (PI), Marechal Floriano (ES), Westfália (RS), São Bonifácio (SC), Uchoa (SP) e Quixabá (PE). Este foi o cálculo que fiz ao ver um condomínio aqui em Xangai – cidade com uma população de mais de 24.15 milhões de pessoas, acima do dobro da população de Portugal. O síndico daquele condomínio é quase um prefeito; e o prefeito de Xangai é quase um Presidente de um país.

A China passa pela maior transformação urbana de sua história. Cidades inteiras são planejadas, ampliadas e construídas com muita rapidez para acolher chineses oriundos das áreas rurais e atrair novos investimentos. O governo aposta na urbanização do país para estimular o consumo interno e o desenvolvimento da nação em tempos de crise econômica mundial. Nos últimos dois anos (2012-2013), quase 40 milhões de pessoas deslocaram-se para as grandes cidades. Contando as últimas três décadas, somam-se mais de 500 milhões de cidadãos chineses que se mudaram para os centros urbanos. Esta migração interna terá impacto no futuro da China.