25 mar 13

O Direito em alta na China

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A China está sob nova direção. Nos dias 14 e 15 de março, a Assembleia Nacional Popular (ANP) elegeu Xi Jinping e Li Keqiang para os cargos de Presidente e Primeiro Ministro, respectivamente. Na China há troca de comando, portanto. Este fato é tão relevante para o mundo quanto a eleição do Presidente dos Estados Unidos. Afinal, estamos falando da segunda maior potência global que conta com 20% da população do mundo.

Esta eleição teve um caráter mais formal. O desfecho era esperado. O espaço institucional de disputa mais importante deu-se dentro do Partido Comunista Chinês (PCCh), em novembro do ano passado, por ocasião do 18o Congresso Nacional do Partido Comunista da China. Xi Jinping havia sido nomeado Secretário-Geral do Comitê Central e vice-presidente da Comissão Militar Central do PCCh. Na estrutura do poder na China, o Secretário-Geral do PCCh assume a Presidência do País. Li Keqiang, por sua vez, havia sido reeleito membro do Comitê Permanente do Bureau Político do Comitê Central do PCCh.

O que há de novo com a eleição destas duas novas lideranças? Dois aspectos foram ressaltados na mídia chinesa. O primeiro deles é o fato de Xi Jinping e Li Keqiang terem nascido após a revolução conduzida por Mao Zedong. Xi, por exemplo, nasceu no ano de fundação da República Popular da China: 1949. São líderes que cresceram e se educaram na China comunista. O segundo aspecto a destacar é que estas novas lideranças têm sólida formação jurídica. Xi Jinping é doutor em direito e graduou-se na Escola de Humanidades e Ciências Sociais da Tsinghua University, com especialização em teoria marxista e educação política e ideológica. Li Keqiang graduou-se em direito e tem mestrado e doutorado em Economia. Esta formação jurídica os habilita para uma das principais tarefas do governo para os próximos cinco anos: o fortalecimento da rule of law.

Neste sentido, uma das pautas assumidas pelo novo governo é a do combate à corrupção. Xi Jinping tem assumido publicamente o compromisso de reduzir a burocracia ineficiente do Estado e que facilita a corrupção. Contará com dois importantes aliados para esta tarefa: o Presidente eleito para o Tribunal Popular Supremo, Zhou Qiang, e o Procurador-Geral da Procuradoria Popular Suprema, Cao Jianming, reeleito para esta função. O primeiro é conhecido pelos seus esforços na promoção da rule of law quando exerceu a função de vice-governador da província de Hunan, em 2006. Cao Jianming, por sua vez, têm longa experiência profissional no campo do direito e em seu primeiro mandato trinta funcionários de nível ministerial ou superior foram investigados por corrupção. Ele faz questão de dizer que “cada caso de corrupção e cada funcionário corrupto devem ser punidos”.

O combate à corrupção está em linha com a discussão sobre a reforma da estrutura administrativa do Estado. Alega-se que diversos órgãos públicos são encarregados de uma mesma tarefa. A segurança alimentar, por exemplo, era supervisionada por uma dúzia de órgãos regulatórios. O departamento responsável pelo setor ferroviário operava tanto como agência administrativa quanto como empresa. Li Keqiang parece disposto a enfrentar este problema e dá a direção a ser tomada: “Nós precisamos deixar para o mercado e a sociedade o que eles podem fazer bem. O governo precisa gerir bem os assuntos que estão sob a sua supervisão”. Esta parece ser a senha para o que vem a ser os próximos capítulos das reformas chinesas. Num primeiro momento, tal declaração pode surpreender positivamente muitos países capitalistas.

Mas haverá uma reforma jurídica e administrativa orientada para o mercado nos termos adotados pelos países capitalistas? Provavelmente não.

As lideranças chinesas parecem comprometidas em preservar o “espírito chinês” que envolve patriotismo e fortalecimento da unidade nacional. Em novembro passado, Xi Jinping declarou: “nosso sistema será melhorado e a superioridade de nosso sistema socialista será plenamente demonstrado através de um futuro melhor”. Socialismo e mercado andarão juntos – o que pode ser traduzido na aliança entre Estado e empresas chinesas. As leis de joint venture são a expressão simbólica desta combinação. Elas incentivam as empresas estrangeiras a estabelecerem, dentro do território chinês, empresas cooperativas com parceiros chineses. Sem esta parceria, não há como ingressar no mercado chinês de maneira exitosa. Um detalhe importante é que boa parte destas empresas chinesas contam com uma participação importante do Estado.

Ao contrário do que o senso comum apregoa no Ocidente, a China não parece ser um país onde a ideologia socialista dita os rumos de quase tudo. No campo da economia (com prováveis reflexos sobre o direito) os chineses são mais pragmáticos do que dogmáticos na defesa do interesse nacional – com a vantagem de saberem fazer uso da experiência histórica deles e aprender com os erros e acertos dos outros países.

Combate à corrupção, crescimento econômico com qualidade e a defesa do rule of law estão na linha de frente das preocupações dos novos líderes chineses. O fato de que eles possuem boa formação jurídica pode tornar a legislação mais prática e fácil de implementar. E isto será feito para favorecer não somente o Estado ou as empresas, mas a “China e o caminho chinês”, como disse Xi Jinping. O novo Presidente quer fazer a população acreditar em uma nova era de ouro: “o sonho da renovação da nação chinesa se tornará realidade”. Para compreendermos plenamente qual direção as reformas jurídicas chinesas irão tomar seria preciso interpretar corretamente este sonho. O problema de levar a bom termo esta tarefa é que estamos ainda sob o efeito de um outro sonho: o americano. Porém, nos últimos anos, este sonho tem se revelado um pesadelo para muitos países.

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3 Comentários

  • Fernando Barquinha says:

    Professor,

    Gostei da matéria, mas senti falta de referências, notas de rodapé.

    • Fernando, já pensei sobre isto ao escrever os posts. Meu objetivo é fazer com que os textos sejam de leitura leve. Temo que, ao fazer referências e notas de rodapé, ele fique menos atrativo para o leitor. O tom quase informal é proposital considerando o fato de se tratar de um blog. De todo modo, esta ainda não é uma questão resolvida para mim. Obrigado pelo seu comentário que me faz retomar esta preocupação. Abraço! Evandro Menezes de Carvalho.

  • De Bolonha a Pequim – nunca será demais salientar a importância dessa mudança sobre os destinos da China, com reflexos internacionais.
    Excelente matéria.
    Referência: http://migre.me/dRe9a

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