A política externa brasileira para a China precisa ser incrementada. Além de ser a segunda maior economia do mundo, a China é um dos maiores investidores e o maior parceiro comercial do Brasil. Definitivamente, deve se dar ao gigante asiático a mesma importância que damos comumente aos EUA.
No entanto, pouco sabemos e pouco fazemos para saber das transformações que estão acontecendo na China, com impacto sobre a Ásia inteira. No Brasil, a visão sobre a sociedade chinesa é desatualizada e, por vezes, preconceituosa.
O governo chinês trabalha com planejamento de longo prazo. E, para isto, tem estimulado a criação de uma inteligência nacional poderosa sobre o mundo. Proliferam centros de pesquisa dedicados a compreender os mais diversos países, suas economias, geopolítica, dinâmicas sociais internas. A China passa a pensar como um ator global –e investe para isto.
O interesse no Brasil é evidente. Grupos de investidores querem saber mais sobre o nosso país e os vários centros de pesquisa sobre América Latina e Brics dedicam ao Brasil um lugar de destaque. Em pouco tempo, a China saberá mais sobre nós do que nós sobre eles.
Brasil e China possuem uma parceria estratégica desde 1993. Esta parceria não reflete nenhum alinhamento ideológico e nem tem fins militares, mas visa incrementar a cooperação nas áreas de ciência e tecnologia, comércio, investimentos, infraestrutura, agricultura, energia e educação. Ela é bem-vinda.
A Comissão Sino-Brasileira de Alto Nível de Concertação e Cooperação (Cosban), criada em 2004, tornou-se o principal mecanismo institucional para desenvolver esta relação bilateral e impulsionar o Plano Decenal de Cooperação Brasil-China assinado em 2012.
Há muito por fazer. E o governo brasileiro, sozinho, não dará conta. Em outras palavras, é preciso que o Itamaraty envolva e se envolva, cada vez mais, com as empresas e centros de pesquisa brasileiros para um esforço conjunto de compreensão e ampliação do diálogo e das iniciativas com os chineses. Neste quesito, a China dá o exemplo.
O governo chinês, favorecido pela sua conformação institucional, atua de maneira integrada com as suas empresas e centros de pesquisa. No Brasil, empresariado e centro de pesquisa habitam mundos distintos. Um ignora o outro por diversas razões.
O Itamaraty poderia ser catalisador de um processo de inovação institucional para a sua atuação internacional conectando-se àqueles dois atores em uma ação produtiva em defesa dos interesses nacionais. Resta saber se há abertura para isto.
Tenho visto aqui na China o esforço empreendido pelos empresários, pesquisadores e diplomatas brasileiros. O Foro Brasil-China, grupo informal baseado em Xangai e que reúne as maiores empresas brasileiras, é um exemplo. Mas sua atuação está muito aquém das possibilidades e potencialidades de uma iniciativa como esta.
Do lado das universidades, USP, UnB, UFF e FGV foram recentemente convidadas para integrar a Liga de Universidades dos Países Brics –uma iniciativa das principais universidades chinesas. Estas e outras ações, ainda embrionárias, precisam ser percebidas como estratégicas para o futuro de nossa relação com a China e podem contribuir para a execução do Plano Decenal.
A China é gigante e complexa demais para ser encarada no improviso ou num empirismo sem inteligência. Mesmo porque a relação com este país inevitavelmente leva-nos a repensar nossas ações em outras regiões do mundo, tais como a África e a própria América do Sul, onde a presença chinesa é cada vez maior.
Integrar o Itamaraty, as empresas e centros de pesquisa brasileiros em torno de um diálogo constante que aprofunde e desenvolva uma inteligência sobre a China e sua política externa, aumentará a qualidade e a eficiência da nossa relação bilateral e, consequentemente, aprimorará a nossa atuação no mundo.
(artigo originalmente publicado na Folha de São Paulo, no dia 08/11/14).
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