18 fev 16

O Papa e a China

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O Papa Francisco surpreendeu o mundo recentemente ao conceder uma entrevista ao Asia Times para falar sobre a China. Este fato, aparentemente trivial, situa-se na superfície de um processo discreto de aproximação diplomática entre a Santa Sé e a República Popular da China.

A China é um estado laico. Há diversas religiões naquele país, sendo o budismo a mais comum. Diz-se que a comunidade cristã corresponde a, aproximadamente, 5% de sua população. O governo chinês considera esta estimativa exagerada. De todo modo, para um país com 1.3 bilhão de pessoas, mesmo um percentual menor representaria um número considerável de fiéis. Estudo do Centro sobre Religião e Sociedade Chinesa da Universidade de Purdue, nos EUA, estima que em 2025 a China terá em torno de 160 milhões de cristãos e que, em 2030, ultrapassará a marca de 247 milhões. Se estes números estiverem em sintonia com a realidade, por volta de 2030 a China poderá ter a maior congregação cristã do mundo e, deste total, 20% seriam católicos.

A China de hoje é diferente daquela de Mao Zedong quando havia muitas restrições às atividades religiosas. Mas é preciso sublinhar que as missões cristãs já não eram bem vistas pelos chineses desde o período final da dinastia Qing por terem se tornado um poder paralelo – respaldado pelos navios de guerra ocidentais – que protegia seus fiéis a qualquer custo, mesmo quando a causa era manifestamente injusta. A história das relações entre a China e as igrejas cristãs é cheia de avanços e recuos. E no que diz respeito à relação com a Santa Sé, há o rompimento na década de 1950 no contexto da Guerra Fria. Pequim cria a Associação Patriótica dos Católicos chineses visando assegurar a observância dos fiéis às políticas do Estado e não ao Vaticano. A igreja oficial da China passa, então, a ordenar seus bispos sem a participação do Papa. Mas agora há sinais de mudança. Rumores dizem que o Papa e o governo chinês devem chegar a um acordo na questão da nomeação dos bispos, por exemplo.

Na recente viagem que fez à Coreia do Sul, o Papa foi autorizado pelo governo chinês a ingressar no espaço aéreo da China – autorização que não foi dada a João Paulo II quando de sua viagem a Ásia. Ao cruzar os céus da China o pontífice argentino disse ter se emocionado. “É necessário reconhecer a grandeza do povo chinês, que sempre manteve a sua cultura. E sua cultura – não estou falando de ideologias que possam ter havido no passado – não foi imposta”, disse o Papa que, ao olhar a China do alto, vê o país desde a melhor perspectiva: a da história cultural do seu povo. Já na Coreia do Sul, o Papa Francisco manifestou a sua vontade de ir à China. Se tal fato se concretizar, ele e o Presidente Xi Jinping estarão deixando uma bela confissão de fé para o mundo: a fé na força do diálogo a despeito das nossas diferenças.

* Artigo originalmente publicado no “Estadão Noite” em 12 de fevereiro de 2016.

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